Filme do Dia: O Mensageiro (1970), Joseph Losey

O Mensageiro (The Go-Between, Reino Unido, 1970). Direção: Joseph Losey. Rot. Adaptado: Harold Pinter, baseado no romance de L.P. Hartley. Fotografia: Gerry Fisher. Música: Michel Legrand. Montagem: Reginald Beck. Dir. de arte: Carmen Dillon. Figurinos: John Furniss. Com: Julie Christie, Alan Bates, Dominic Guard, Margaret Leighton, Michael Redgrave, Michael Gough, Edward Fox, Richard Gibson.
          Na Inglaterra eduardiana do início do século XX, Leo Colston (Guard) é um garoto de uma família com problemas financeiros que é enviado para passar as férias de verão com a nobre família Trimingham. Ele logo se afeiçoa da irmã mais velha de seu colega de traquinagens, Marian (Christie). E também do fazendeiro vizinho, com fama de conquistador sexual, Ted Burgess (Bates). Ambos utilizam sua ingenuidade para torná-lo mensageiro de sua correspondência amorosa, que se destina sobretudo a marcar os encontros clandestinos. Desconfiada da situação, a família aceita de bom grado o noivado de Marian com seu primo Hugh (Fox), veterano da Guerra dos Böers. No dia do aniversário de Leo, a mãe de Marian (Leighton), que flagrara ela passando uma mensagem para o garoto, decide desmascarar pessoalmente o envolvimento da filha com o fazendeiro.
          Losey conduz com admirável senso atmosférico sua narrativa, menos preocupada de fato nas reverberações da relação afetiva do par em questão, como habitual, do que em representar a perspectiva de um amor que não se concretiza por conta dos impedimentos sociais marcados pela distinção de classe a partir de um garoto, significando igualmente para o último o seu traumático rito de iniciação ao mundo adulto. A suntuosidade de seu trabalho de câmera, locações e cenários se encontra menos voltada para o mero deleite visual do que para delimitar o estrito controle social que uns exercem sobre os outros. E isso é demonstrado menos explicitamente do que através da apresentação de rituais sociais, sobretudo o comensal. Ou ainda apresentando o contraste entre as condições primárias de moradia de Burgess com relação aos Trimingham. Algo também evidente na constante contraposição entre um universo completamente voltado para o trabalho, no caso de Burgess, e as meras obrigações sociais que compreendem a preocupação do mundo aristocrático. Quando tais universos se tocam, não se pode esperar algo de muito diferente da terra que desce das mãos de Burgess sujando o imaculado papel de carta de sua amada, prenunciando o próprio fim dramático de uma relação que, doutro modo, seria condenada eternamente a clandestinidade. O único momento em que a demarcação social arrefece um pouco, o do esporte, representado por um torneio de críquete e subseqüente festa, não deixa tampouco de ser alvo de comentários sobre os modos “embrutecidos” de Burgess. Desse, ao contrário, não se escuta qualquer comentário em reverso. Isso, porque o filme não aposta em qualquer representação do  universo interior de seus personagens. Antes o oposto.  O modo distanciado com que tudo é narrado, que levantou críticas por parte de alguns pela ausência de envolvimento com a narrativa, é uma estratégia consciente do realizador, admirador da dramaturgia de Brecht, com quem chegou a trabalhar. O filme talvez se ressinta menos de tal estratégia, bem articulada, do que de seu final, que volta a apresentar Marian e Leo décadas após, comentando os episódios, de forma sumária e desnecessária. Assim como dos não menos desnecessários flashforwards que pontuam, de forma não muita clara, toda a  narrativa, que foi construída com grande dívida ao dramaturgo Pinter, em sua terceira colaboração com Losey.  Palma de Ouro em Cannes. EMI Films/Robert Velaise Prod./John Heyman Prod./Columbia Pictures para MGM/EMI. 118 minutos


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