The Film Handbook#84: Os Irmãos Taviani

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Irmãos Taviani

Vittorio: Nascimento: 29/09/1929, San Miniato, Itália
Morte: 15/04/2018, Roma, Itália
Paolo: Nascimento: 08/11/1931, San Miniato, Itália

Carreira: 1954 -

Constantemente distanciando-se dos princípios do neo-realismo (cuja relação a qual comparam com a de amor-ódio que um filho sente por um pai), Vittorio e Paolo Taviani tem forjado um cinema no qual fábula, fantasia, história e mito se combinam. Embora a realidade sócio-política ainda figura entre suas preocupações, suas narrativas crescentemente formalistas e frequentes imagens surreais projetam temas metafísicos tais como o papel interpretado pelo cinema e pela linguagem, tradição e memória, na busca por uma Utopia.

Inspirado por Paisà de Rossellini, os Taviani fundaram um cineclube e escreveram ocasionalmente críticas de cinema enquanto estudavam na Universidade de Pisa. Em 1954,  em colaboração com Cesare Zavattini, realizaram sua estreia na direção com o documentário  San Miniato, Iuglio'44, um curta sobre o massacre perpetrado pelos nazistas em retirada em seu próprio vilarejo toscano. Tendo estabelecido seu método de trabalho incomumente próximo (escrevem o filme juntos antes se revezando na direção de cenas específicas) eles continuaram sua carreira no campo do documentário até 1962, trabalhando em colaboração com o sindicalista Valentino Orsini, em intervalos nos quais foram assistentes de direção para diversos realizadores incluindo Joris Ivens e Rossellini. Seu longa de estreia, Un Uomo da Bruciare, antecipava muito de sua obra posterior em sua história de ação coletiva e auto-sacrifício (as tentativas idealistas de um político de provocar o campesinato contra os opressivos proprietários da Máfia que resulta em seu assassinato) assim como ao minar as noções convencionais de realismo através da irônica comédia, fantasia e uso teatral e simbólico da música e da dança. A maior parte de sua obra inicial chama a atenção por uma atitude iconoclástica, e mesmo pessimista, em relação à ideologia existente. Os Fora da Lei do Casamento/I Fuorileggi del Matrimonio, questiona as leis italianas do divórcio; em Os Subversivos/I Sovversivi, entremeiam retratos de vários membros do Partido Comunista refutando a ideia de que todos os esquerdistas possuíam ideias similares; a ação utópica, revolucionária foi observada como um processo problemático e em curso em San Michelle Aveva un Gallo que diz respeito a prisão por dez anos de um intelectual radical que eventualmente comete suicídio. Ao mesmo tempo, um crescente desdém pelo realismo foi evidente em um crescente envolvimento com o simbolismo, a metáfora e um trabalho de câmera crescentemente estilizado.

Allonsanfan foi sobre um veterano aristocrata revolucionário cuja relutante participação numa hesitante revolta camponesa siciliana em 1816 que finda com sua própria morte. O filme foi um exemplo extravagante da habilidade dos Taviani de contrapor seu pessimismo político com uma mescla operística com movimentos extravagantes, cores lúgubres, músicas, danças e imagens fantásticas. Ainda mais notável foi Pai Patrão/Padre Padrone>1 que fez uso de uma arquetípica história neo-realista, um jovem pastor sardenho sofre insuportáveis infortúnios econômicos, físicos e espirituais até que consiga escapar para o Exército - transformando-a numa cruel, engenhosa e brechtiana fábula sobre o potencial para o crescimento individual (o rapaz finalmente aprende a ler no Exército) em face do patriarcalismo autoritário, Ao início e final do filme Gavino Ledda - cuja autobiografia serviu como trama - alerta ao ator sobre como interpretá-lo e fala diretamente à câmera; a despeito desse e de outros artifícios não naturalistas, o filme permanece profundamente comovente e provocou o reconhecimento internacional dos irmãos.

O Prado/Il Prato, sobre um jovem que retorna a sua vila no campo idealizada por suas memórias, foi uma visão ainda mais oblíqua da alienação política; mas em A Noite de São Lourenço/La Notte di San Lorenzo>2, os Taviani transformaram suas memórias pessoais em mito glorioso e ressonante, quando metade dos habitantes de uma aldeia toscana desobedeceram as ordens nazistas e escaparam para os campos, onde não apenas escutaram a destruição do único mundo que conheciam, mas por fim se juntaram à Resistência na luta contra os nazistas. Novamente, o realismo é mantido à distância ao se ter a história observada - e embelezada -   por uma garota de seis anos, uma fonte de fantasia onírica, surreal e tragicõmica.

Kaos>3 foi uma visão igualmente idiossincrática da vida camponesa, adaptada de um punhado de histórias sicilianas de Pirandello, notáveis por não terem nenhum sentido definido, moral ou resolução final: uma mulher descobre que seu marido é um lobisomen; um vidraceiro conserta um vidro; um vilarejo conquista vitória temporária em sua batalha contra um latifundiário. As mudanças de tom do filme e seus símbolos ambivalentes são, na verdade, uma reflexão sobre o caos da existência, mas ao mesmo tempo do próprio cinema que, através do ato de narrar, impõe certa ordem.  Um tributo ainda mais direto dos Taviani ao meio que escolheram foi Bom Dia, Babilônia/Good Morning Babilonia>4, no qual dois irmãos toscanos - pedreiros cuja família havia decorado as catedrais italianas por séculos - viajam para Hollywood, onde encontram trabalho desenhando os elefantes (símbolos da memória) para o cenário babilônico do Intolerância de Griffith. Para os Taviani (que negam qualquer leitura autobiográfica no retrato dos irmãos, para quem a separação representa morte) o cinema é uma nova memória coletiva, um passado utópico que, por sua habilidade de recordar o nosso presente, torna possível nossa existência no futuro. Em sua engenhosas, líricas e comoventes meditações sobre o modo como a arte empresta sentido e propósito à vida eles prestam sua homenagem a um cinema que é ao mesmo tempo mítico, filosófico e profundamente populista.

Recentemente, os Taviani tem se provado como os mais recorrentemente criativos realizadores italianos, extraindo de suas obsessões privadas filmes que são tocantes, lúdicos, sensatos  e, de forma sempre divertida, autenticamente cinemáticos.

Cronologia
Em seu interesse político e épico pela memória, os Taviani são talvez mais próximos de Theodoros Angelopoulos que de contemporâneos italianos como Bertolucci, Marco Bellochio e Ermano Olmi. Apesar de Rossellini ter sido certamente uma influência, pode-se observar na sua obra uma relação com Dovjenko.

Leituras Futuras
Italian Cinema from Neo-Realism to the Present de Peter Bondanella (Nova York, 1983).

Destaques
1. Pai Patrão, Itália, 1977 c/Omero Antonutti, Saverio Marconi, Fabrizio Forte

2. A Noite de São Lourenço, Itália, 1982 c/Omero Antonutti, Margarita Lozano, Claudio Bigagli

3. Kaos, Itália, 1984 c/Margarita Lozano, Omero Antonutti, Claudio Bigagli

4. Bom Dia, Babilônia, Itália, 1983 c/Vincent Spano, Joaquim de Almeida, Charles Dance

Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres; Longman, 1989, pp. 286-7.

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